A Inegra – Instituto Negra do Ceará vem a público manifestar o seu apoio às/aos estudantes que ocuparam as escolas estaduais do Ceará, durante os 107 dias de greve das/os professores. Por isso assinamos a nota dos movimentos, organizações, coletivos e pessoas pra dizer ao Governo do Estado que lutar, ocupar e resistir não são crimes!
Governo Camilo, lutar, ocupar e resistir não são crimes!
Os/as estudantes secundaristas da rede pública estadual do Ceará protagonizaram um importante movimento de reivindicação frente à realidade de sucateamento do ensino público no Estado. Em luta por uma educação pública de qualidade, foram mais de 60 escolas ocupadas de abril a agosto de 2016. As escolas apresentam uma série de situações de violações do direito à educação, como a infraestrutura precária, alimentação escolar de má qualidade que não atende aos parâmetros do Programa Nacional de Alimentação Escolar, água contaminada em bebedouros, a desvalorização dos professores e a demissão de profissionais terceirizados, dentre muitas outras. As ocupações protagonizadas pelos estudantes também se solidarizaram ao movimento de greve das/os professoras/es que durou 107 dias.
As(os) estudantes expressavam a necessidade de sonhar com um modelo de escola compatível com os anseios de uma juventude que busca lazer, esporte, comunicação, cultura, liberdade e respeito. Com inspiração em movimentos estudantis do Chile e de diversos Estados brasileiros como Rio de Janeiro e São Paulo, as ocupações das escolas marcaram um movimento democrático e participativo que convocou as comunidades escolares e das cidades a participarem de um sonho que nunca se pensou em sonhar só.
As escolas paralisadas se tornaram palcos para intervenções artísticas e formativas, concomitantes aos mutirões de reforma e cuidado com o espaço físico das escolas. O movimento cresceu e as(os) jovens envolvidas(os) realizaram assembleias para apresentação das pautas reivindicatórias, todas elencadas no painel de uma educação mais inclusiva e libertadora. Fortaleza e os outros municípios cearenses com escolas ocupadas, que chamaremos a partir de agora ESCOLAS RESISTENTES, puderam constatar que a educação no Estado não consegue resolver os seus problemas antigos: a merenda é pobre em nutrientes e não tem investimento do Estado; bebedouros são contaminados, ora por falta de saneamento, ora por baratas em caixas d’água; a instalação elétrica é precária e há quedas constantes de energia; a fiação elétrica é exposta; tetos e ventiladores (estes, quando têm) caem em salas de aula; mofo e deterioração em paredes e livros de bibliotecas; quadras de esporte e espaços de lazer com mato ou sem proteção nenhuma para crianças e adolescentes; além de uma longa lista de particularidades.
A constatação que a educação agoniza no Estado não seria o pior momento do movimento das escolas resistentes. Com o fim da greve das(os) professores(as), após a desrespeitosa proposta de reajuste zero no salário da categoria, surpreendeu-nos a notícia de que a Secretaria da Educação do Governo do Estado do Ceará (SEDUC) enviara denúncia criminal contra as(os) estudantes, a maioria adolescente, com base em relatórios escritos por diretores e coordenadores das escolas, solicitados pela Secretaria e pela 16ª Promotoria de Justiça de Defesa da Educação. Os relatórios citam nomes de adolescentes que supostamente participaram das ocupações, informam se estes participam de alguma organização política e indicam danos duvidosos ocorridos durante o movimento de ocupação. Até o momento, mais de 300 estudantes foram citadas(os) nos procedimentos policiais mencionados e estão sendo intimados, por meio de policiais armados em suas casas, a comparecer à Delegacia da Criança e do Adolescente para prestar depoimentos. É possível que o número de alunas(os) notificadas(os) aumente, configurando em uma das maiores tentativas de criminalização de adolescentes já promovida por uma gestão pública. Soma-se a isso o fato de que os estudantes ocupantes vêm recebendo tratamento discriminatório por parte da gestão de suas escolas como, por exemplo, a negação do seu direito à merenda escolar.
Assim, as organizações, movimentos, coletivos e pessoas abaixo assinados vêm a público manifestar o seu repúdio à ação da Secretaria de Educação do Ceará, por iniciar uma perseguição sem precedentes às(aos) jovens das escolas resistentes, gerando conflitos familiares e comunitários impossíveis de mensurarmos. Se o estado precisa se posicionar sobre o movimento Ocupa Ceará, que seja para agradecer às(aos) estudantes por participarem ativamente da construção de uma Educação ideal. Ressaltamos a nossa defesa incondicional de uma educação pública, gratuita, de qualidade e verdadeiramente democrática e emancipatória.
Organizações, movimentos e coletivos que assinam esta Nota:
1 – Campanha Criança Não é de Rua
2 – Cáritas Brasileira Regional Ceará
3 – Centro de Assessoria Jurídica Universitária – CAJU (UFC)
4 – Centro de Defesa da Criança e do Adolescente – CEDECA Ceará
5 – Centro de Defesa da Vida Herbert de Sousa – CDVHS
6 – Coletivo de Assessoria Jurídica Universitária Popular de Quixadá-CE – Direito Unicatólica (Cajup Sitia)
7 – Coletivo de Construção da REDE JUBRA – CEARÁ
8 – Coletivo Marias
9 – Comitê Cearense Pela Desmilitarização da Polícia e da Política
10 – DIACONIA
11 – Fórum Cearense de Mulheres
12 – Fórum Justiça
13 – Frente das Mulheres dos Movimentos do Cariri
14 – Fundação Marcos de Bruin
15 – Grupo de Valorização Negra do Cariri
16 – Integrasol
17 – Instituto Ambiental Viramundo
18 – Instituto Negra do Ceará
19 – Jovens Agentes da Paz (JAP)
20 – Mais Cariri
21 – Núcleo de Assessoria Jurídica Comunitária – NAJUC
22 – Nudi Jus – Núcleo Direito, Infância e Justiça
23 – O Pequeno Nazareno (OPN)
24 – Pastoral Carcerária do Ceará
25 – Piquenique Feminista
26 – Pretas Simoa
27 – Programa de Assessoria Jurídica Estudantil – PAJE
28- REAJI – Reunião Estudantil de Assessoria Jurídica de Iguatu
29 – Rosas de Luta
30 – Serviço de Assessoria Jurídica Universitária da UNIFOR
31 – SINDURCA
32 – Tambores de Safo
33 – Visão Mundial
Pessoas que assinam esta Nota:
1 – Célia Rodrigues – Orientadora e Comunicadora de Gênero no Rádio
2 – Deputado Estadual Renato Roseno (PSOL)
3 – Lídia Ribeiro Nóbrega – Defensora Pública Federal
4 – Merilane Pires Coelho – Ouvidora Geral Externa da Defensoria Pública do Ceará
5 – Raquel Coelho – Doutoura em Direito e Professora da Faculdade de Direito da UFC
6 – Rodrigo de Medeiros Silva – Advogado, membro da Rede Nacional dos Advogados e Advogadas Populares – RENAP, do Fórum Justiça-FJ, da comissão Nacional de Acesso à Justiça do CFOAB e da Articulação Justiça e Direitos humanos – JUSDH